Seja por amor, seja por apego, ou simplesmente pelo desejo vão da continuidade indefinida, tentamos sempre impedir o fim ou, pelo menos, prolongar a existência de tudo o máximo que podemos. As reticências no título desse post demonstram o quanto é difícil para todos nós colocarmos um ponto final em nossas questões de vida.
E quando o ponto final é para a vida em si, a dificuldade é quase tão grande quanto a vontade de que o eterno seja a lei da existência.
Essa semana as reticências que vinham se prolongando transformaram-se em ponto final na vida de Seu Vicente, o meu vô Pipoca. Perdi meus avós paternos há alguns anos e já tinha me esquecido da dor que é perder alguém de quem se gosta tanto. Mas não vou ficar falando dessa dor. Ela vai permanecer aqui, por muito tempo, vai sumir por vezes e vai voltar latejando e momentos inesperados. E, um dia, vai se diluir nas emoções do dia a dia…
E vai ficar, além da lembrança terna, a certeza de que tudo tem um fim.
Por isso, decidi que este é o último post da Toca do Cuty. O blog existe desde 2006 e foi o espaço que usei para externar sentimentos, reclamar, escrever sobre meus projetos e devanear. Mas faz algum tempo que não tenho podido dedicar meu tempo à Toca e venho dando uma sobrevida desnecessária ao blog. Por isso, em homenagem ao Vô Pipoca, àquele que, mesmo sem querer, sempre nos ensinou muito sobre a vida, a Toca vai se calar agora e para permanecer num silêncio altivo pelo tempo em que os servidores do WordPress decidirem mantê-la no ar.
Jamais pensei que fosse finalizar a Toca com uma foto de time de futebol. Mas não é um time qualquer, é o Boca Júniors. Não aquele da Argentina, um muito mais importante e feroz, capaz de fazer o campo do distrito de Paula Lima ferver mais do que o La Bombonera. O time foi liderado pelo temido e furioso Seu Vicente, de pé torto e caráter reto. A foto não revela, mas esse Boca aí de baixo ostentava cores bem diferentes das do seu irmão argentino. Era tricolor: verde, branco e vermelho. Era o orgulho do Vô Pipoca!
A foto abaixo, restaurada, foi meu presente para ele na última vez em que o vi. Quando ele a pegou, demorou um pouco para ter certeza do que se tratava, mas logo começou a dizer os nomes dos jogadores e a relembrar os momentos sobre o gramado. Olhando nos seus olhos era possível ouvir o som da torcida, sentir o cheiro da terra que se solta ante a fúria das chuteiras, ouvir os gritos, os pedidos de passe, os gritos de gol. E pensando agora sobre aquele momento, sobre as lembranças que romperam o tempo e se refizeram na retina cansada de meu avô, compreendo as reticências do título, pois tudo acada… mas não na memória.